Hoje, estive no vizinho município de Pedrão. Não foi a primeira vez. Já
estive, por lá, quando o Ministro Juca Ferreira visitou o lugar, por projetos da
área cultural. Alagoinhas aproveitou a oportunidade, para falar sobre os projetos
de restauração da Igreja Inacabada e da Estação São Francisco. Lá se vão mais
de dez anos… Como o tempo tem passado, com rapidez! Ao entrar na cidade,
com um classificador debaixo do braço, cheio de papel, fui recepcionada por um
cavaleiro, vestido a caráter, coberto de couro, da cabeça aos pés. Do chapéu,
que tirou da cabeça para me cumprimentar, ao par de botas, com esporas
afiadas e polidas. Era a representação típica de um “encourado de Pedrão”,
naquela vestimenta que lembrava a luta, pela Independência da Bahia e o
orgulho de poder participar do desfile comemorativo da data magna da Bahia – o
Dois de Julho. O cavaleiro puxou a rédea do animal e o freiou, bem à minha
frente. Eu parei também, e ele disse, estendendo o braço esquerdo: esse é o
meu Pedrão. Vamos fazer um registro. Eu fiquei de pé, junto a ele, imponente do
alto do seu cavalo e alguém fez a foto que ele me mandou, tempos depois, numa
moldura, para pôr sobre a mesa .
Esse cavaleiro era Jorge Galdino, mas, essa não era sua única paixão.
Poeta, membro fundador da Casa do Poeta- CASPAL, defensor de seu espaço
artístico, da produção poética, da divulgação dos trabalhos literários de seus
pares. Pela vontade de divulgação, colaborava com jornais escritos e programas
de rádio e até criou um programa, no Serviço de Som de Edgar Torres, só para
falar de poesia.Com essa temática, produziu várias obras que deixou como
legado e que o fez alvo de análises e exposições, por estudantes de nível
fundamental, médio e superior de escolas de Alagoinhas, de Pedrão, da
Universidade do Estado da Bahia. Por sua produção poética e dedicação à arte
da palavra, foi indicado, por outro poeta, Reginaldo Santana, para ocupar uma
cadeira, na Academia de Letras e Artes de Alagoinhas. E, em 2005, tomou posse
na cadeira número 31. Esse ganho de experiências o levou também para a
Câmara de Literatura do Conselho Municipal de Política Cultural, na condição de
titular, onde atuou, sempre, com muito empenho. Morador do Bairro do Mangalô,
dividia seu espaço físico de residência, com o Mercado do Artesão, onde tem
sede provisória, a Casa do Poeta de Alagoinhas. E essa sua participação efetiva
na vida sociocultural de nossa cidade, lhe valeu o Titulo de Cidadão
Alagoinhense, outorgado pela Câmara de Vereadores, por indicação de seu
vizinho do bairro do Mangalô, o Vereador Thor de Ninha, em 2018, o que o
deixou muito feliz e mais perto do coração de Alagoinhas.
Isso era muito bom. Mas, nada disso, tirou de seu pensamento e de seu
sentimento, a prioridade para Pedrão. A vontade de escrever sobre seu” torrão
natal”, o fez procurar ajuda dessa sua colega de CASPAL, pela experiência em
trabalhos de memória, e fez um esforço digno de reconhecimento. As manhãs
de domingo passaram a ser dedicadas a essas discussões, na nossa casa, onde
ele chegava cedinho e sem pressa. Daí resultou o livro que conta a história de
Pedrão. Que orgulho ele sentia, pela produção de tal obra! Que emoção, no
lançamento do livro, em sua terra natal! Quanto prazer ao falar desse trabalho
que distinguia o seu território de nascimento! Galdino, porém, queria algo maior.
Premiar sua terra com uma obra que envolvesse e encantasse a todos. E essa,
pedindo licença a todas as outras obras, é a sua criação de maior vulto, pois é o
símbolo de representação do Município, junto com a Bandeira: o HINO de
PEDRÃO! Ele fez muitas músicas, em diferentes ritmos, de samba, de forró…
Tinha esperança de gravações profissionais e chegou a ouvir, algumas, de
amadores, e intérpretes amigos. Mas isso era brincadeira, diante da criação
inspiradora do amor cívico a ser despertado, com o cântico do Hino de sua
querida Pedrão, sua composição musical de maior proeminência.
Podemos dizer, pois, sem titubeios, que Galdino viveu e honrou, com sua
prática de vida, dois municípios irmãos: Pedrão e Alagoinhas. E hoje, por ele,
Alagoinhas foi a Pedrão. E eu tive a grande honra de representar a minha querida
cidade, nessa homenagem a Jorge. Hoje, ele não pode me receber, trajado,
tipicamente, como “Encourado de Pedrão”. Ele estava lá, com uma roupagem
diferenciada. Não podia falar, como participação ou agradecimento. Mas, podia
inspirar e estimular muitas falas e exposições. E os pedronenses estavam
preparados para fazer bonito. Para falar com as palavras e pelas lágrimas. Para
lembrar do amigo, ou do professor, ou do poeta, ou do vizinho, ou do compositor.
E aí, declararam ou leram seus poemas, citaram suas obras, cantaram canções
de infância, canções da entidade- toadas, do grupo associativo criado por ele.
Os Vereadores trouxeram as histórias de suas lutas em diferentes momentos,
especialmente, a campanha pela aprovação do Hino de sua terra natal. E esse
Hino foi cantado, por todos, no encerramento da solenidade. Por entre esse
conjunto de pessoas agradecidas e emocionadas, Alagoinhas teve a deferência
de um espaço solicitado pelo nosso Diretor de Cultura que me fez companhia na
viagem. Era preciso falar. E, em nome da Secretaria de Cultura, Esporte e
Turismo, lembrei a presença de Jorge Galdino, na Casa do Poeta, na Academia
de Letras e Artes, no Conselho Municipal de Cultura. Da Câmara de Vereadores,
cuja reunião estava acontecendo, na mesma hora, em que a homenagem
acontecia lá. Falei da Nota de Pesar e do Luto, por três dias, assinado em
Decreto pelo Prefeito Joaquim Neto. Nesse ínterim, a filha começou a
agradecer, muito emocionada, o que comoveu todos os presentes naquela hora
de despedida. Algumas pessoas ainda se manifestaram após sua fala, sempre
com palavras de agradecimento ao nosso poeta.
Saímos daquela sala, em cortejo, para entrar em um espaço vizinho, com
bonito portão e uma data sugestiva ao alto: 1865. Edson Carneiro, ainda fazendo
alguns poucos registros fotográficos, comentava sobre as flores que levamos
para ele: amarelas, como ele gostava, lembrando também que aquele era o local
de sua preferência para depositar seu corpo inerte, quando chegasse a hora
derradeira. E os dois pensávamos: que esse pedaço de chão, de sua terra natal,
seja tão acolhedor para o seu corpo, como você foi, durante toda sua vida, um
apaixonado por seu “torrão natal”! Mas, que sua alma busque sair desse labirinto
de emoções, para galgar outros andares desse edifício divino, a fim de escrever
outros poemas, outras canções e outras histórias. Vá, na paz de Deus, Jorge
Galdino de Santana.
Iraci Gama, na noite de 17.06.2021.
Iraci Gama – secretária municipal de Cultura, Esporte e Turismo – SECULT de Alagoinhas- Bahia.