Quem é essa mulher? Quem é ou quem foi ela?
Quem foi. É a resposta inicial, pois ela está no passado do Brasil. Mas ela vive no nosso presente. Pois há tantas Terezas nessa nossa terra, nesse nosso Planeta TERRA, lutando para viver, para sobreviver! Ela é um exemplo muito bonito a ser seguido!
Tereza de Benguela é vida real. Mas, me lembra uma personagem criada pelo nosso Jorge Amado, no romance Mar Morto. O pescador Guma vai para o mar, e não volta da pesca. Sua amada – Lívia – o espera, por horas, à beira do mar, ansiando pela visão do saveiro, mas isso não acontece. E agora? Sozinha, o destino já estava traçado: iria virar mercadoria, como tantas outras! E um belo dia, para surpresa de todos que estavam na praia, esperando os pescadores, com sua produção, surge um Saveiro, conduzido por uma mulher. É Iemanjá, gritaram os mais crédulos! Mas era Lívia, mudando esse destino que nos cabe traçar. Trazia o saveiro cheio de peixes e a notícia de que ela, agora, teria a pesca, como seu meio de vida. É a nossa Tereza do mar.
Porque aquela, do interior do Estado do Mato Grosso, já na divisa, com a Bolívia, era mulher de Zé Piolho, o comandante do Quilombo do Quariterê. Era um espaço de liberdade, de produção, um parlamento nas decisões. Mas ficava dentro de uma área assumida, como própria, por gente que foi trazida da África, como escravo, para empregar suas energias, sem qualquer consideração ou respeito, no cultivo da terra, gerando riqueza para quem tinha o capital e o poder. Estavamos no período colonial e o Governo Português matou Zé Piolho para controlar o Quilombo. E Tereza? O que aconteceu com ela? Tomou as rédeas do trabalho. Continuou produzindo, coordenando tudo, na mistura de negros e índios, porque os nossos irmãos indígenas também foram massacrados( e continuam sendo!), nesse período, e ali, refugiados no Quilombo, davam sua competente contribuição, para a sobrevivência física e moral de todos. Tereza era a grande condutora da vida daquela gente. Administrava e representava a comunidade. Vendia a produção e coordenava a segurança. Dirigia um barco e quando aparecia, diziam: lá vem a Rainha Tereza!
Quanta semelhança com a nossa Lívia, hein! Quando Jorge Amado montou esse enredo e criou essa história, ele estava nos dizendo, do ponto de vista dele, que a mulher tem esse potencial de superação, de vibração, de força, de coragem, de iniciativa, de insubmissão. O poder de tomar a dianteira e dirigir a própria vida. Tereza assumiu, ainda, a ousadia de enfrentar o poder constituído que queria transformar sua gente, em animais de carga, alegando que eles não tinham alma. E ela, pelo trabalho, afrontou a todos, provando, na prática, que era possível outra situação. Que, sem alma, seria impossível, tanta criatividade! E o que saía daquela terra, era produzido, com muito amor.
” A arte imita a vida!” Dizem, por aí. A vida é o espaço de criação artística de cada um de nós. Digo eu. A arte de viver. E, nesse território, ninguém ganha das mulheres pretas! Se as mulheres já sofrem um processo diário de discriminação e preconceito, a mulher preta faz um acréscimo a tudo isso, multiplicando várias vezes essa dificuldade. Mas ela vem buscando formas de vencer as adversidades, para demonstrar seu potencial de criação, de resistência, de antevisão dos fatos. Quando Monteiro Lobato construiu uma personagem chamada Anastácia, no Sítio do Pica-Pau amarelo, ele a encheu de competências para fazer delícias da alimentação. E nós sabemos, a história revela e a memória conserva as misturas especiais que a senzala produziu e hoje caracteriza a mesa do brasileiro: a feijoada, o sarapatel, o caruru, o vatapá. Essa gastronomia representa o nosso Brasil, junto com a baiana , seu traje típico, seu tabuleiro, com acarajé, abará e tudo o mais. São as mulheres pretas mostrando seu brilho.
Quando eu era menina, havia uma professora leiga, na rua Castro Alves, quase na Praça Castro Alves. Ela era preta, gorda, baixinha, ensinava as primeiras letras – professora Vivi. A professora Haidee Amorim contava com muito garbo que foi aluna dela. Na mesma rua Castro Alves, morava a senhora Rosa Amorim – a matriarca da família. A imagem mais forte que guardo dela é de uma mulher bem alta, de ” bom corpo”, fazendo um discurso, na sede do Clube Esportivo Cruz de Ferro que era o clube de futebol dos Ferroviários. Esta sede ficava aqui na rua Dois de Julho, perto do Centro Espírita União e Caridade. Outra preta muito importante, frequentava a minha casa e me encantava com sua fala. Era não era advogada, mas buscava o apoio de advogados e juízes, para ajudar pessoas que precisavam de orientação Jurídica . Chamava- se Maura Cardoso. Já no princípio da juventude, na euforia das manifestações populares, conheci Maria, presidente da Associação das Lavadeiras de Alagoinhas. Era a alegria em pessoa. Morava ( e ainda mora) no Alto do Santo Antônio. É desse tempo, também, outra preta muito decidida, que vinha, a pé, do Tombador para participar dessas manifestações, e era a responsável pelos cânticos da caminhada. Na Jornada dos Lavradores, todo 25 de Julho, ela estava presente, com a mesma alegria e a força na voz – Maria, do Tombador – inesquecível.
Falei de cinco mulheres pretas de Alagoinhas. Todas Terezas! Pela força do ideal. Pela decisão da vida familiar. Pela mesma herança africana que trazem no sangue e na história. Hoje, temos muitas outras, em várias posições, dentro da sociedade, mas o fundamental é que guardemos o espírito disposto a combater: o desemprego, o subempregos, a violência, a intolerância, o preconceito e todos esses males causados pelo desamor e pela irresponsabilidade. Invoquemos Tereza, para inspiração! Falemos de Tereza, para manter acesa a chama do ideal de liberdade que era sua marca registrada! Mas, principalmente, sejamos Tereza todos os dias, para honrar seu nome e sua história.
VIVA 25 de Julho – Dia Internacional da Mulher Negra, Latino-americana e Caribenha ! DIA DE TEREZA DE BENGUELA- a nossa Rainha Negra do Quilombo Quariterê! Um VIVA muito especial para as MULHERES PRETAS DE ALAGOINHAS!!!
SALVE 25 de Julho de 2021!!! Alagoinhas, Iraci Gama.
Iraci Gama – secretária municipal de Cultura, Esporte e Turismo – SECULT de Alagoinhas- Bahia.