Mário Silva** tinha entre 15 e 16 anos de idade quando precisou entrar no Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM) que está completando 20 anos. No estado da Bahia, neste primeiro semestre, 41 pessoas, sendo 30 crianças e adolescentes, e 11 familiares, que sofrem ameaça de violência letal receberam a proteção.
Na época, seu irmão foi assassinado por envolvimento com drogas. “Quando mataram meu irmão, eu acabei me viciando em drogas e, com o tempo, eu passei a ser ameaçado de morte. A gente conseguiu a proteção pelo Conselho Tutelar da cidade onde eu morava. Se a gente soubesse que o programa existia antes, talvez o meu irmão estivesse aqui hoje”, relata Mário.
A existência do PPCAAM não só salvou sua vida, mas ressignificou sua trajetória. Em três meses dentro do programa, parou de fumar e voltou a estudar. “Hoje, eu me sinto bem psicologicamente e fisicamente. Concluí meus estudos, tirei minha habilitação, comprei minha moto, ajudei a construir uma casa para minha mãe, construí minha casa, uma família”.
Dados
No Brasil, só no primeiro semestre deste ano foram incluídos 337 crianças e adolescentes no PPCAAM e 468 familiares. Desde a implantação do programa, em 2003, até o primeiro semestre de 2023, 14.152 pessoas foram protegidas. Os dados são do Sistema de Informação para a Infância e Adolescência do PPCAAM.
A iniciativa é amplamente debatida no 23º Encontro Nacional do Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte, evento promovido pelo Ministério de Direitos Humanos e Cidadania (MDHC) em parceria com a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos da Bahia (SJDH). O evento começou, ontem, e segue até o próximo dia 22, no Tribunal de Justiça do Estado da Bahia.
Prioridades
A atuação do programa, desafios e estratégias de melhoramento são foco das discussões. “O PPCAAM se constitui de várias redes e isso ajudou a criação e o desenvolvimento para, nesta quarta-feira, 20, estarmos presentes no Núcleo Nacional na Secretaria de Direitos da Criança e do Adolescente do Ministério de Direitos Humanos, e também em 18 estados. Só não temos mais por deficiência burocrática. Mas temos a missão de ano que vem chegar às 27 unidades da federação”, afirma Cláudio Vieira, secretário Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente do MDHC.
A programação abordou temas como “Racismo e Letalidade Intencional de Crianças e Adolescentes no Brasil” e a “Apresentação da Resolução 498 do Conselho Nacional de Justiça”, além da “Experiência de sucesso na prevenção da violência letal no estado do Ceará”.
Segundo Trícia Calmon, superintendente de Apoio e Defesa aos Direitos Humanos da SJDH, a maior dificuldade é integrar os outros órgãos para que a rede de proteção possa contribuir melhor. “Quando uma criança ou um adolescente é retirado daquela situação de perigo com sua família, o impacto psicológico e socioeconômico é grande. Mas não é saudável que a vida fique interrompida. A gente precisa de uma qualidade no atendimento do Sistema Único de Assistência Social, no SUS, na área de Trabalho, Emprego e Renda, aquilo vai dar uma dinâmica na vida daquelas crianças, adolescentes e familiares para que ela consiga retomar sua vida”.
Outro ponto é haver mais diálogos com os municípios para que as crianças e adolescentes protegidos não precisem demorar tanto para conseguir se estabelecer numa dinâmica social, cotidiano escolar e de trabalho, no caso dos familiares. “O que desafia mais é sobre como gerar menos impacto permanente à vida dessas crianças e adolescentes e familiares. A partir da mobilização de famílias que possam acolher, inserção mais rápida nas unidades de acolhimento, dialogando com os municípios para que acolham e saibam como buscar o programa para fazer cessar rapidamente a situação de ameaça”, destaca.
De acordo com Flávia Mundim, consultora de segurança do núcleo técnico federal do PPCAAM, é feito um mapeamento por análise de risco e é entendido para onde o adolescente e seus familiares podem ser levados. São quatro portas de entrada: Conselho Tutelar, Ministério Público, Poder Judiciário e Defensoria Pública. “A partir do momento que chega um caso de ameaça, é avaliado pela equipe, é feita uma entrevista com o adolescente com seus familiares para entender o contexto”, explica.
*Sob a supervisão da editora Meire Oliveira
**Nome fictício