Por Mackson Viana
A 3ª Edição da Festa Literária Internacional do Paiaiá – FliPaiaiá realizada entre as datas 27 a 30 de julho, no povoado de São José do Paiaiá, em Nova Soure, no Litoral Norte e Agreste Baiano, superou as expectativas de público. Com o objetivo de valorizar e fomentar a educação e a literatura nas comunidades e nas escolas da região, o evento contou com programações virtuais, além de 2 dias de atividades presenciais que atraíram cerca de 4 mil pessoas.
Segundo o curador da FliPaiaiá 2022, Luiz Eudes, passaram pelo evento, visitantes de diversos segmentos da sociedade. “A soberania foram os estudantes, não só de Nova Soure como de Sátiro Dias, Itapicuru, Olindina, Cipó, Ribeira do Amparo, Pombal, Crisopólis, Inhambupe, enfim, envolvendo toda a região. E ainda leitores, admiradores, artistas, fotógrafos, jornalistas, etc. E é exatamente este caldeirão que torna a FliPaiaiá está festa linda, envolvente, emocionante e acolhedora”, relatou.
Na ocasião marcaram presença intelectuais da literatura nacional e do estado da Bahia. No campo editorial, a Nabi Editora fez parte da programação do evento, tendo um estande com livros editados em português e em língua estrangeira, como espanhol, alemão. “Também contamos com editores, ativistas culturais, movimento indígena, escritores de vários estados, em especial Bahia, Alagoas, Sergipe e São Paulo; Academias de Letras do Vale do Itapicuru e a Gloriense, e a participação de quatorze membros da Casa do Poeta de Alagoinhas”, completou.
Amante da literatura e das letras, a estudante Joane Ingrid, 16 anos, veio da sede do município de Nova Soure, para prestigiar o evento literário. Desde pequena foi incentivada pela família para se dedicar ao mundo dos livros. Além disso, Ingrid falou sobre a importância do acesso à leitura. “É importante que os povoados tenham uma biblioteca rural, principalmente para as pessoas que não tem muito acesso à leitura. Pois as bibliotecas são também fundamentais para o processo de desenvolvimento mental. Dentro dos livros podemos tirar muitos aprendizados”, comentou.
Apesar de fazer parte da “geração digital”, a adolescente ainda disse que prefere ler livros físicos ao invés dos que são publicados em formato digital, como os E-book. “A gente sente as palavras, o sentimento que o livro passa. Pela internet não, a gente dá mais importância para o que vem depois, então eu prefiro o livro de papel. Desde pequenininha eu sempre gostei, a leitura sempre foi importante para mim. Graças a Deus a minha família me ajudou bastante com isso”, declarou estudante. Na ocasião, estudantes de diversas escolas públicas aproveitaram para ler revistas em quadrinhos que estavam suspensas em árvores e também visitou a Biblioteca do Paiaiá.
Segundo o escritor e curador da FliPaiaiá 2022, Luiz Eudes, a festa literária teve um balanço positivo. “Trago em mim os melhores sentimentos a respeito da III FliPaiaiá. Sobretudo a gratidão ao professor Geraldo Prado, ao José Arivaldo, ao Francisco, à população de São José do Paiaiá e a todos os participantes que atenderam ao chamado, aceitando participar sem pedir nada em troca. Isso é amor à arte. Houve entrega absoluta e o resultado, claro, foi rico e incrível. Necessário se faz dizer do apoio incondicional do prefeito de Nova Soure, Luís Cássio, e da secretária municipal de Educação, Poliana Macedo, para a realização do evento”, disse.
Biblioteca do Paiaiá
Criada em 2005, no povoado de São José do Paiaiá, em Nova Soure, no sertão da Bahia, a Biblioteca Comunitária Maria das Neves Prado (Biblioteca do Paiaiá), tem como idealizador e fundador o professo Geraldo Moreira Prado.
O projeto da Biblioteca nasceu com o objetivo de promover o reforço do hábito da leitura e a importância da formação de monitores, bem como a capacitação de professores do ensino fundamental do meio rural.
Considerada a maior biblioteca rural da América Latina, o local possui um acervo de 120 mil títulos, incluindo exemplares de literatura infanto-juvenil e 5 mil gibis, além de relíquias como 2 mil CDs, 1.600 DVDs e 133 fitas de vídeos. Além dos livros, a Biblioteca também oferece para a comunidade outras atividades como aulas de futebol, vôlei, xadrez e ateliê de pintura.
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O baiano Geraldo Prado cresceu no povoado de São José do Paiaiá e depois foi estudar em São Paulo, onde passou um bom tempo trabalhando como faxineiro de dia e de porteiro à noite para bancar seu sustento e a compra de livros.
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Inicialmente, Geraldo fez vestibular para Medicina, mas preferiu cursar História. Fez mestrado em Cultura Brasileira e em Desenvolvimento Agrícola. E também tem doutorado em Desenvolvimento Agrícola e Cultura Rural do Brasil.
Palestras
Para celebrar o centenário do escritor ‘modernista baiano’ Dias Gomes, a escritora e Secretária de Cultura de Alagoinhas, Iraci Gama, fez uma palestra sobre as contribuições de Dias Gomes para a história do Teatro de Alagoinhas (BA). “ Pelas suas posições de vida, pelas suas proposições de trabalho, pelo seu posicionamento social e cultural, sempre na defesa dos direitos humanos, Dias Gomes inspirou um grupo de estudantes do curso de Contabilidade, em Alagoinhas, para criar um grupo de teatro com o nome dele, passando a ser chamado de Grupo Teatral Dias Gomes”, relatou.
Mas de acordo com Iraci Gama, o Grupo Teatral Dias Gomes de Alagoinhas foi censurado pela ditadura militar. “Esse grupo funcionou de 1962 até 1965 com esse nome e, como em 65 foi censurado, teve que tirar o nome de Dias Gomes e colocar outro. Mas o importante é que o espírito de criação e de rebeldia contra as injustiças que era próprio de Dias Gomes é que marcou aquele grupo de estudantes de Contabilidade que continuou em nosso meio por muito tempo”, completou.
Iraci ainda destacou que o Grupo Teatral Dias Gomes mudou de nome, mas a censura gerou consequências à história do teatro em Alagoinhas. “A censura fez uma interrupção momentânea no trabalho desse grupo teatral. Mas como diretor era uma pessoa dinâmica e forte, que era o professor Antônio Mário dos Santos, ele conseguiu influenciar o grupo para não desistirir do teatro e continuou trabalhando e encenou outras peças. Até a década de 70 ele ainda realizou muitos trabalhos com crianças, jovens e adultos”, relatou.
Dentre as apresentações feitas pelo Grupo Teatral Dias Gomes de Alagoinhas o destaque foi “Irene”. “A peça fala das dificuldades que os pais tinham na criação e na formação dos filhos, inicialmente envolvendo os adolescentes. Para aquela época era uma temática muito interessante”, disse.
No elenco da peça, Iraci foi o papel da personagem “Vovó Deolinda”. “A velha Deolinda era a avó de Irene. Ela tinha um papel interessante. Acompanhava tudo e interferia. Mas não interferia com negativismos. O que era mais bonito é que ela era uma velha que conseguia entender a juventude, acompanhar e participar da vida daqueles jovens”, concluiu.
Rodas de Conversa
A festa literária teve também várias rodas de conversas, dentre elas a do professor, poeta e cacique Juvenal Payayá. Nas discussões ele falou sobre o resgate das contribuições do povo indígena Payayá para a criação e formação do povoado de São José do Paiaiá, em Nova Soure. Na segunda parte de sua participação, Juvenal e sua esposa Edilene Payayá discutiram sobre trocas de saberes criadas entre várias etnias, gerações e áreas do conhecimento sobre as questões dos fenômenos que tem abalado a humanidade, como por exemplo, o vírus da Covid-19, a ação dos órgãos internos para a sobrevivência do ser humano, o átomo e as partículas subatômicas. “Nós não somos filósofos, nós somos indígenas. E percebemos que a fenomenologia filosófica tende se limitar a conhecimento. E nós trabalhamos além do conhecimento. É quando a gente traz a real situação da natureza em relação ao universo. E quando a gente fala de fenômenos, a gente de certa forma fala de ser humano e do Grande Criador e do Grande Espírito”, destacou.
O tema da discussão foi baseado no livro “Fenomenal ou Vento em Fúria” que é de autoria de Juvenal e de Edilene Payayá. A obra tem 100 páginas e traz a descrição de 180 fenômenos. “No livro estão elencados esses fenômenos para que possamos compreender em primeiro lugar que a Terra não é mundo, ela só faz parte dele. Nada foi feito sem um objetivo, tudo foi feito pelo Criador. Nada é por acaso”, revelou.
Lançamentos da FliPaiaiá 2022
Na 3ª Edição da FliPaiaiá foram lançadas obras de autores locais e da cultura indígena com sessão de autógrafos. “Aconteceram diversos lançamentos durante a III FliPaiaiá e foram bastante concorridos. O livro Poemas dos Olhos D’Água do Paiaiá é a prata da casa. Também foram lançados os livros infantis A Menina Marciana de Noêmia Alves e Uma Mãe que Parou de Reclamar de Mazé Maurício, que também lançou Poetizando a Vida na Pandemia, livro de poemas. Foram autografados os Lavra Agônica e Transfusão, do José Erenilson; Âncoras, Velas e Pedais, de Esron Carvalho; Fenomenal, de Edilene Payayá e Cacique Juvenal Payayá (que proferiram emocionante palestra); além de muitas outras obras”, disse o curador do evento.
A FliPaiaiá 2022 terminou no último sábado (30) com apresentações culturais, circenses e mais de 6 palestras virtuais. A expectativa para a próxima edição do evento já é grande pelo público. “Os passos seguintes serão reuniões para análise de tudo o que aconteceu, sobretudo onde precisaremos aprimorar para entrega de uma festa melhor na edição seguinte”, disse curador da festa literária.
Outras fotos da FliPaiaiá: