Pedra no sapato da Seleção Brasileira, implacável e muito organizada tática, técnica, física e emocionalmente, a França bateu o Brasil pela quinta vez seguida e ampliou um tabu no futebol feminino que já chega a incomodar. Este foi o 12º confronto entre as equipes, em Copas do Mundo, e a terceira vez que Brasil e França se enfrentaram: 1 a 1 (Estados Unidos, 2003, pela fase de grupos), 2 a 1 (França, 2019, pelas Oitavas de Final, após a prorrogação), e 2 a 1 (Austrália & Nova Zelândia, 2023, na primeira fase).
Com a equipe masculina, a história é quase a mesma, pois o Brasil não vence a França desde 1958, quando levantou a Taça Jules Rimet pela primeira vez. Nestes últimos 65 anos, porém, foi eliminada pelos “Les Bleus” após empate em 1 a 1 no tempo normal e 4 a 3 nos pênaltis (México, 1986, pelas Quartas), derrota por 3 a 0 (França, 1998, na Final) e nova decepção por 1 a 0 (Alemanha, 2006, também nas Quartas).
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A verdade é que a goleada do Brasil por 4 a 0 na estreia contra o Panamá – com direito a hat-trick de Ary Borges e o golaço de Bia Zaneratto – , nos fizeram sonhar após o fechamento da primeira rodada. A potência ofensiva do Brasil contra um time sem qualquer possibilidade estatística, apontada por supercomputadores e sites de apostas de ser campeão somada ao empate da França com a Jamaica, levantou dúvidas sobre o favoritismo das europeias e trouxe ilusões de que a Seleção Brasileira pudesse sair do Suncorp Stadium, em Brisbane, já classificada.
A realidade, no entanto, foi bastante cruel e mudou bastante as perspectivas, fazendo a equipe verde-amarela ir do céu ao inferno em poucos dias. Se um ponto já seria bom demais frente à equipe europeia, com o resultado favorável, a França, seguramente uma das favoritas ao título, assumiu a liderança do Grupo F e fez o Brasil terminar a rodada fora da zona de classificação. Isso porque a vitória da Jamaica contra o Panamá, por 1 a 0, derrubou a Seleção Brasileira para a terceira colocação e eliminou as panamenhas.
Num primeiro tempo impecável das francesas, Eugenie Le Sommer abriu o placar aos 17 minutos e o Brasil segurava o 1 a 0 graças a uma grande apresentação da goleira Lelê (Letícia Izidoro Lima da Silva). As brasileiras equilibraram o jogo e Debinha (Débora Cristiane de Oliveira), artilheira da era Pia, deixou tudo igual aos 13 do segundo tempo.
Mas, aos 37 da etapa final, após cobrança de escanteio, a zagueira Wendie Renard não perdoou, apareceu sozinha na segunda trave e, cabeceando para o chão, recolocou as francesas na frente. O Brasil ganhou até a torcida de australianos que estavam no estádio, que também celebravam toda vez que Marta Vieira da Silva aparecia no telão. A torcida começou a pedir a entrada da jogadora brasileira, que mostrava aflição no banco, e foi atendida somente aos 40 minutos do segundo tempo, com o placar já decretado.
Não é preciso dizer que futebol é jogo coletivo e que uma derrota não é resultado de uma única pessoa. A própria técnica Pia Sundhage afirmou isso em várias ocasiões durante a tensa coletiva após a derrota. Mas, a análise fria do resultado prova que a treinadora também teve sua parcela de culpa no placar.
Erro de Pia?
Sem tirar os méritos da equipe adversária, a comandante sueca não conseguiu organizar taticamente tamanho talento individual e qualidade de nossas atletas, pois passou a semana toda falando sobre bola aérea e encontrou a derrota com dois gols de cabeça. Escalou mal, não agiu quando era nítido o abalo emocional de nossas jogadoras a cada dividida de bola vencida pela França ainda no primeiro tempo, não corrigiu a escalação no intervalo, e demorou muito para colocar Marta em campo. Num esquema bagunçado, a maior jogadora brasileira de todos os tempos praticamente não tocou na bola e ficou perdida na frente.
A treinadora admitiu que o ataque da França surpreendeu a Seleção Brasileira principalmente no primeiro tempo, viu erro de posicionamento no gol do desempate, e sem rodeios cravou que a falha central da equipe verde-amarela foi não conseguir fazer um jogo com o estilo brasileiro, como normalmente vem ocorrendo. “É importante estar bem defensivamente e também no ataque. O futebol é um jogo de detalhes e de precisão, sobretudo em campeonatos com esse peso. (…) Existem muitas pérolas na Copa do Mundo, mas o que faz a diferença é o colar”, afirmou.
Os jornalistas que acompanharam a coletiva brasileira após a partida relataram que o astral do Brasil foi do céu ao inferno, de um ambiente completamente festivo a um clima de velório. O mesmo sentimento foi percebido nas ruas completamente tomadas por brasileiros, com festa, churrasco, cerveja e um silêncio fúnebre depois da derrota.
Em terceiro lugar e fora da zona de classificação, a Seleção Brasileira precisa vencer o desânimo e a Jamaica, às 07 horas (horário de Brasília) da quarta-feira, 02 de agosto, para seguir na Copa do Mundo. A equipe caribenha chega à partida com a vantagem do empate para se garantir nas Oitavas de Final. Este resultado também permite a classificação caso a França perca para o Panamá, que apenas cumpre tabela na última rodada.
As “Reggae Girlz”, como são conhecidas, chegam animadas com a sua primeira vitória da história em Copas do Mundo Femininas. Nas duas edições que participaram – em 2019 e a atual -, tinham, como retrospecto, até o jogo de sábado, três derrotas e um empate.
Além da tensão com o próximo jogo, a derrota perante a França complicou o possível caminho do Brasil para chegar à Final, pois, dentro das simulações matemáticas, iria enfrentar equipes teoricamente mais fracas nas Oitavas e Quartas, tendo seu primeiro embate eliminatório contra uma das favoritas apenas na Semifinal. Agora, esse caminho pode ter sido abreviado colocando as poderosíssimas Alemanha, Inglaterra e a França (novamente), nesta ordem, pelo caminho antes de um encontro com Estados Unidos ou Espanha, que têm tudo para chegar à decisão.